Revista ESPM - maio-jun - Brasil Assombrado. Que caminho seguir. - page 68

entrevista | Celso Ming
Revista da ESPM
|maio/junhode 2013
68
res dessa política dizendo que é pre-
ciso aprofundá-la para colher resulta-
dos. Portanto, teríamos de radicalizar.
Outro grupo sustenta que nós [
como
país
] mudamos o
mix
de políticas para
promover transformações estruturais
na economia brasileira, e isso demora
para dar resultado. Então, teríamos de
ir em frente na mesma linha. Só que
não hámais tempo para esperar.
Alexandre –
Dá para antecipar o que
acontecerá em seguida?
Ming –
O governo Dilma vai tocar
isso [
a economia
] do jeito que der nes-
te e no próximo ano para emplacar
nas eleições. E aí terá de redefinir.
Essa redefinição de políticas tem dois
caminhos. Fazer essa radicalização,
que gente como Arno Agostim [
secre-
tário do Tesouro Nacional
] e Luciano
Coutinho [
presidente do BNDES
] estão
defendendo dentro do governo, ou
assumir uma nova postura, porque o
empresariado está alarmado.
Alexandre –
Oque é essa nova postura?
Ming –
O governo precisará de uma
política fiscal mais controlada e rígi-
da para reduzir os juros, os custos da
economia, e garantir um mínimo de
competitividade à indústria. E terá
de tomar decisões importantes na
área energética. Não é reduzir tarifas
da energia elétrica, fazer puxadinhos
aqui e acolá. Não é essa política de de-
soneração e reduções temporárias de
impostos. Isso não servemais.
Alexandre –
Na verdade, é a retoma-
da de uma discussão que parecia supe-
rada no Brasil. Discutir, por exemplo,
até que ponto se pode aceitar inflação
em alta. Até que ponto é importante
ter superavit primário e qual vai ser a
âncora da economia. São discussões
de 1993 e 1994, quando o país estava
ainda se livrando da inflação crônica.
Ming –
Exatamente. O que você falou
sobre a leitura que se faz da crise de
2008 por aqui é crucial. O que muita
gente diz é: “Acabou o modelo neoli-
beral, o Consenso de Washington. A
economia americana se ferrou. Agora,
o modelo a se apropriar é o asiático,
sobretudoochinês”. Essediscursopós-
2008marcou a administraçãoDilma.
Alexandre –
O que se vê hoje no gover-
no Dilma começa no segundo governo
Lula, sob a justificativa ideológica de que
o modelo anglo-saxão havia naufragado
e era preciso encontrar uma alternativa.
Ming –
Agora, vai acontecer exata-
mente o contrário. A China vai en-
trar em crise, porque não pode mais
manter uma política de crescimento
puxado por exportações com base
em baixo custo de salários. Os Esta-
dos Unidos vão retomar a atividade
econômica explosivamente.
Alexandre –
Pela lógica, o mais prová-
vel, se Dilma for reeleita, seria um recuo.
Ming –
Vejo os setores estratégicos
do governopresos a essa visão [
do pós-
2008
]. Até porque, deu certo politica-
mente. Nunca houve um presidente
do Brasil coma popularidade e a apro-
vação que tema presidente Dilma.
Alexandre –
Por queparamos de crescer?
Ming –
Para responder a essa per-
gunta, preciso fazer uma digressão.
Há uma certa confusão entre obje-
tivos estratégicos. A afirmação “eu
preciso crescer”, até agora seria en-
tendida como “preciso criar empre-
gos”. O crescimento era importante
por gerar empregos. Mas estamos
num momento paradoxal em que
temos condições ruins de PIB e in-
flação em uma situação de pleno
emprego. Se o Brasil crescer mais,
vai prejudicar omercado de trabalho,
criando um custo extra brutal. O
país não pode crescer muito mais. O
potencial de crescimento do Brasil,
hoje, não é de mais que 3% ao ano. A
oferta de mão de obra não cresce na
mesma proporção, por razões demo-
gráficas e educacionais.
Alexandre –
Crescer mais elevaria o
custo da mão de obra. Mas por que o
país não cresce?
Ming –
Em primeiro lugar, porque
não pode crescer. Segundo, o país
está crescendo não na indústria,
mas em outros setores. O setor de
serviços está crescendo fortemente.
E ele pesa entre 68% e 69% no PIB. Por
esse número, você vê que a prioridade
para aumentar o crescimento do PIB
seria puxar o setor de serviços, e não a
indústria. De novo: há uma confusão
de objetivos estratégicos. Queremos
que a indústria cresça mais, por quê?
Há um crescimento do consumo da
ordem de 7% a 8% ao ano, do qual a
indústria não consegue dar conta.
As políticas de conteúdo local e reserva de
mercado começama perder sentido. Se vai todo
mundo para os Estados Unidos [
atrás do gás de
xisto
], vai se exportar de lá para onde for
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