Revista ESPM - maio-jun - Brasil Assombrado. Que caminho seguir. - page 62

sistemas regulatórios
Revista da ESPM
|maio/junhode 2013
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ticamente maiores que os custos da mobilização da ação
coletiva. No mais, seria praticamente impossível regredir
paraosistemaanteriorderegulaçãobaseadonomonopólio
burocrático vigente até o final dos anos 1980, que tratava,
então, com um mercado dez vezes menor, mais lento e
menos complexo, como defende o argumento liberal da
impossibilidade de recolocar o “gênio de volta à garrafa”.
O intérprete do interesse coletivo
Poroutrolado,alongarecessãoiniciadaem2008temposto
emdúvida,também,omodeloestataldegeriraestabilidade
e o bem-estar social. Aprópria tese de que o Estado possua
uma legitimidade superior por ser o interlocutor do bem
comum, que para Karl Polanyi (autor de
The great transfor-
mation
, Beacon Press, 2001) significaria especificamente
a defesa contra o mercado, acaba sendo questionada. Isso
porque as instituições estatais têm encontrado múltiplas
dificuldades para pôr emprática a defesa do coletivo, espe-
cialmente por meio da operacionalização de um aparelho
burocrático partidarizado, tecnocrático, desinformado,
defasado tecnologicamente, conceitualmente e juridica-
mente, com instrumentos construídos e consolidados
para responder a questões de outra época. Essa situação
seria a expressão de uma “crise de legitimidade” do Estado
contemporâneo,umavezquetambémenfrentariaodesafio
deveresvaziadooconteúdonacionalistadeseusdiscursos
de legitimação, como proposto por Habermas, em1978.
Nesse sentido, os críticos do modelo estatizante argu-
mentam que, antes de serem intérpretes dos interesses
coletivos, as burocracias estatais procurariamdefender os
próprios interesses cartoriais, e de seus clientes, também
provocando irracionalidades, tais como desalinhamentos,
desequilíbrios,bolhas,desinvestimentos,comportamentos
oportunistas, corrupção e desperdícios. Entretanto, para
os defensores da ideia da existência de uma sintonia entre
regulação estatal e interesse público, lembramque, embora
existamdificuldadesnaregulaçãoeuropeiacontemporânea,
taisproblemasnãoseriaminerentesaomodeloestatalemsi.
Essaobservaçãolevaemconsideraçãoosucessoregulatório
deoutrosEstadosemergentes,baseadonumapresençamais
incisivasobreaaçãocoletiva,talcomoocorrehojenaChina,
ÍndiaeRússia.E,talcomoocorreunaCoreiadoSul,noJapão
e na Europa de outros tempos, como Ha-Joon Chang sugere
no livro
Chutando a escada
(EditoraUnesp, 2004).
Nesse debate, a chamada teoria francesa da regulação,
descrita por Robert Boyer em
Théorie de la régulation
(Editora La Découverte, 2004), chama a atenção para o
caráter cíclico e momentâneo das disfuncionalidades
regulatórias, em que os mecanismos institucionais po-
demrevelar-se desadaptados frente ao amadurecimento
de novas circunstâncias sociais, fazendo com que eles
percam sua capacidade de ver, perceber e, assim, de
atuar sobre as dinâmicas em curso. Cada sociedade
seguiria, assim, “tateando” por meio de soluções
ex-post
,
de tentativas, erros e novos ajustes depois de cada crise,
procurando um índice de compatibilidade regulatória
aceitável, num contínuo e humano processo de bricola-
gem, relatado por Boyer. Um
gap
regulatório que deman-
daria, segundo o autor de
Théorie de la régulation
, cerca
de 20 anos para ser pavimentado.
A crise de 1929 levoumuitos americanos às ruas
doDistrito Financeiro da cidade deNova Iorque
latinstock
Seriapraticamente impossível regredir
para o sistema anterior de regulação
baseadonomonopólioburocrático
vigente até ofinal dos anos 1980
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