Maio_2005 - page 54

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J U L H O
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A G O S T O
D E
2 0 0 5 – R E V I S T A D A E S PM
Ruy
Mesquita
JR
–Qualéo realgraude influência
de um jornal como
O Estadode S.
Paulo
–com suascaracterísticasde
seriedadeeobjetividade–numpaís
em que só uma em cada cinco
pessoas lê jornal?
RUYMESQUITA
–Apesar da crise
– que todos os jornais do mundo
vêm atravessando desde que
cresceu a influência da Internet –
houveum reflexonacirculaçãodos
jornaisnoBrasil –que, aliás,nunca
foi brilhante, nem proporcional
mesmo aos países vizinhos, como
a Argentina. Os jornais argentinos
têmumacirculaçãonacionalmuito
maiordoqueos jornaisdosestados
brasileiros. Nenhum jornal, no
Brasil, pode ser considerado
nacional. Todos os grandes jornais
visam influenciar o que podem
influenciar, que é a elite dirigente
dopaís, ou seja, Brasília. Sem falsa
modéstia,hádois jornais,noBrasil,
que sempre deram prioridade à
própriaopinião: emprimeiro lugar,
e sempre, o
Estado
, desdeo tempo
domeuavô,quando já tinhagrande
influência sobre as esferas gover-
nantes.Ooutroéo
JornaldoBrasil
.
O
Globo
praticamente não tem
editorial. O
Estado
tem uma
coerênciana linhaeditorial, desde
asua fundação,comasadaptações
necessárias às evoluções da
sociedade. Meu pai educou-me,
fazendo-me lerosclássicosgregos,
comoTucidides eum livroque, na
época, era fundamental, chamado
A cidade antiga
, de Fustel deCou-
langes, que sintetizava o conflito
que até hoje vivem as facções
políticas no mundo, dos regimes
maisdemocráticoscontraosmenos
democráticos.Repito issoa todosos
estudantes que vêm aqui: esse
negócio de esquerda e direita é
antigo como a civilização, e cito
sempreoqueconsiderocomouma
das melhores definições, até hoje,
dademocraciacomoelaéhoje,que
é a oração fúnebre de Péricles aos
mortos da guerra do Peloponeso,
dizendoqueeleserammaisvaloro-
sos do que os adversários; porque
esses iam lutar porque eram obri-
gados, enquantoos atenienses iam
se quisessem. Até hoje somos fiéis
a essa linha. Durante todos os
conflitos terríveisaqueassistimos–
emeupaimais doque eu, porque
ele pegou a Primeira e a Segunda
GuerrasMundiais. Enfim, a impor-
tânciaque têmos jornais,noBrasil,
me surpreende todos os dias. Não
háumeditorial nosso, criticandoo
governo, ouum ministro, quenão
tenha resposta imediata. No
governoLula, por exemplo, apoia-
mos a política econômica desde o
primeirodia.ConheçooLuladesde
que apareceu, sou amigo dele,
entrevistei-o pela primeira vez em
1978.Apesardesermosadversários
ideológicos, achei a eleição dele
positivaparaopaís, namedidaem
que revelou,paraomundoexterno
–quenuncaacreditouque isso fosse
possível –, a democracia social do
Brasil que permite a um homem
comoelechegaraopoder supremo
do país. Estou tão decepcionado
comoqueestáacontecendoquanto
os seuscorreligionários.OPalocci,
queeunãoconheciapessoalmente
–embora,naprefeituradeRibeirão,
pelasmedidasqueeleadotou, reve-
lassequenãoera radicaldeesquer-
da –, me procurou várias vezes,
pedindo apoio para coisas que
queriaver aprovadas, dizendoque
ninguém imagina a influência de
um editorial do Estado, na véspera
de uma votação importante no
Congresso.
GRACIOSO
– Como se sente, ao
exercer esse poder dentro do
contextoda liberdadedeexpressão
que, felizmente, temos no Brasil?
Quepapela liberdadedeexpressão
assume,nummomentocomooque
vivemos?
RUYMESQUITA
– O papel que
estou descrevendo: de formar
opinião.O jornal dá a sua opinião
na página 3 e tem a sua liberdade.
Antes de acontecer o que
aconteceu, comoGenoino, ele foi
meucolaborador regular...
JR
– A opinião do jornal é sua
pessoalmenteoudeumgrupo?
RUYMESQUITA
–Éuma teoriaque
tenhoe já foiatépublicadaem livro.
Digoqueo jornal tempensamento
próprio.Seodiretordo jornalbrigar
comessepensamento,quiser impor
o seupessoal – semverquea força
do jornal foiexatamenteacoerência
que teve durante 130 anos –, ele
compromete o jornal. Hoje tenho
até um time excessivo – só tenho
trêseditoriaispordiae,noentanto,
são oito ou dez editorialistas entre
“NO GOVERNO LULA, APOIAMOSA POLÍTICA
ECONÔMICA DESDE O PRIMEIRO DIA.”
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