Valores_Marco_2010 - page 66

ENTREVISTA
R E V I S T A D A E S P M –
março
/
abril
de
2010
66
do problema que leva a esse desrespeito?
Olhandoparao futuroa longoprazo, atra-
vésdeumtrabalhoquelevariaumaouduas
gerações, é possível incutir nas crianças e
na cabeçadosqueaindanãonasceram, as
coisas que gostaríamos que acontecesse?
Seique issoéfacilmenteconfundidocomo
poderditatorial–deve-selembrarqueBur-
rhusFredericSkinner,aos50anos,sugeriu
algoparecidono livro
Beyond freedomand
dignity
, de 1971, e issoo tornoumal visto
pelosintelectuais,principalmenteamerica-
nos.Comovocê reageaestaespeculação?
JOSÉ GREGORI
– No fundo é o que está se
procurando, aindaquedemaneira incipiente,
fazernoBrasil enomundo: dar cadavezmais
espaço para os direitos humanos, para o fato
deque“aéticanãodeve ser tiradada jogada”.
GRACIOSO
–A chaveestánisso, napala-
vra e no sentidode ética.
JOSÉGREGORI
–É, eoproblemada igualdade
naquiloqueé fundamental,nãonauniformiza-
çãoounocerceamento.Agora,porexemplo,uma
dascoisasmaismodernasemmatériadedireitos
humanos é o projeto daONU chamadoMetas
doMilênio, que visa corrigir as desigualdades
maisflagrantesexistentesnomundoem15anos
– começou em 2000 e deve terminar em 2015.
Infelizmente,issonãoempolgouenemmobilizou
como se poderia imaginar. Mas expos a ideia
deque amelhora será frutodaparticipaçãode
todos e de que para isso você não pode criar
novas injustiças. No século XXI, a caminhada
daquiloqueestádebaixodoguarda-chuvados
direitos humanos é fascinante, porque tudo o
que for feitocomequilíbrioecompetência, virá
embenefíciodeumahumanidademaispacífica,
menos conflituosa equedê a todos essaopor-
tunidadequenós três,nestamesa, tivemos.Em
algumamedida,osdireitoshumanoscolabora-
ram para que três
oriundis
num país diferente
daqueledosnossosantepassados,dosTrópicos,
pudessem, cadaum, dar o seu recado. Enunca
fomos discriminados pelo fato de não termos
vindonas caravelaspioneiras.
GRACIOSO
–Éverdade.Você falouem tró-
picos, mas certamente leu, mais de uma
vez, o livro
Tristes Trópicos
, de Claude
Lévi-Strauss.Elecontaoquepresenciouna
aldeiadosNambikwara, noMatoGrosso,
e que lá, sem nenhuma forma aparente
de opressão, disciplina ou controle, tudo
ocorriaexatamentecomodeveria.Semque
ninguémdesseordensoufalassemaisalto,
cadaumsabiaexatamenteoquedeviafazer
num determinado momento. Foi daí que
nasceu o estruturalismo dele. Quemara-
vilhaseriasenonossomundo, ummilhão
devezesmaiscomplexo,issofossepossível.
JOSÉGREGORI
–Achoquevaiser,souotimista.
Apesardos revesesnofim, ademocraciaaberta,
participativa e impulsiva acaba prevalecendo.
Imagine se apessoaque viuMussolini no auge
como fascismo, ouHitler no auge donazismo,
poderia imaginar que poucos anos depois isso
tudo iria esfarelar para prevalecer exatamente
aquiloqueeles tinhamodireitodecaçoar como
coisade ingênuos, deutopistas inconsequentes.
Hoje, no mundo, a ditadura não respeitadora
dos direitos humanos é um resíduo que ainda
tem forças evidentemente, mas é um resíduo e
asnovas gerações sãomais abertas que anossa
aessa ideiademaior identidadeentreeles.Claro
que vão passar pelasmarchas e contramarchas
que a nossa geração também passou. A nossa
vidanão foiuma linha reta,masumziguezague
comaltos ebaixos, commomentosdepressivos,
momentosdesatisfaçãoplena,demuitotrabalho
eachoquenofimvai cairno lugarcomum,mas,
ameuver,cheiodesabedoria,eobemvaiacabar
prevalecendosobreomal.
DESIMONI
–Ministro, depois desses altos
ebaixos, ocidadão JoséGregori, em1998,
recebeomaior prêmiodaONU em come-
moraçãoaos50anosdaDeclaraçãoUniver-
saldosDireitosHumanos.Só issovalepor
todaumavida. Issonãoéumapergunta, é
apenasumcumprimento:Parabéns!
JOSÉGREGORI
–Entãocabeomeuagradeci-
mento:muitoobrigado!
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