legislação
Revista da ESPM
| janeiro/fevereirode 2013
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gurados principalmente no art. 5º da Constituição Federal
do Brasil, não devem ser esquecidas. Caso contrário, as
liberdades conquistadas, emdecorrência de fatos quemu-
darama história da humanidade (aRevoluçãoFrancesa e a
SegundaGuerraMundial,porexemplo),taiscomoliberdade
deexpressãoemanifestaçãodepensamento, deconvicção
política e religiosa, cairiampor terra.
Miguel Reale, emsuaobra intitulada
Nova fase do direito
moderno
(Editora Saraiva, 1991), demonstra que, assim
como o direito adaptou-se às novidades trazidas pela Re-
volução Francesa e àquelas ocorridas até a última década
doséculoXIX(queincluemoadventodainvençãodovapor
como fonte de energia) — denominada primeira fase do
direito moderno — e adaptou-se, também, às mudanças
sociais ocorridas na primeira fase do século XX (que tem
como fontedeenergiaaeletricidade) —caracterizadacomo
a segunda fase do direito moderno —, deverá também
adaptar-se à era dos computadores e processos cibernéti-
cos. Essanovaadaptaçãocorresponderiaà terceira fasedo
direitomoderno (que temas energias atômicaeeletrônica
como novas fontes utilizadas pela sociedade).
Assim leciona o eminente jurista em
Nova fase do di-
reito moderno
: “Se a primeira e a segunda fases do direito
moderno correspondem, respectivamente, ao vapor e à
eletricidade como fontes de energia, podemos correla-
cionar à energia atômica e à eletrônica uma nova fase da
experiência jurídica, ainda emprocessamento e, por isso
mesmo, objeto de prudente configuração, sem olvido, é
claro, de fatores de ordem espiritual.
Não resta dúvida, porém, que os computadores ou ela-
boradores eletrônicos, assim como os supercondutores,
vierama subverter as coordenadasdaexperiênciahumana
emgeral,nãoapenasnoqueserefereàsmutaçõesoperadas
nos domínios do trabalho, cada vez mais intelectualizado
ou tecnicizado com o advento dos processos cibernéticos,
mas tambémno concernente aosmeios vertiginosos de co-
municação, impondocadavezmaismodelosde linguagens
adequados àmemória dos novos engenhos”.
Para Reale, esse fenômeno não pode deixar de atingir
profundamente a experiência jurídica.
A tarefa de conciliar as novas necessidades de organiza-
ção social decorrentes do surgimento de novas tecnologias
às prerrogativas conquistadas pelos indivíduos durante a
história da humanidade cabe, essencialmente, aos três po-
deres do Estado: ao Legislativo, no sentido de criar normas
de conduta que atendamàs novas necessidades criadas em
virtude da revolução digital e que, ao mesmo tempo, não
sejam inconstitucionais por restringirem prerrogativas
asseguradas na Constituição Federal. Ao Executivo, no
sentido de estabelecermecanismos de controle e aplicação
da lei que não sejam arbitrários e que venham a se tornar
inconstitucionais e ilegais por ultrapassaremos limites da
lei e da Constituição Federal. E ao Judiciário, que deve solu-
cionar os conflitosque surgemda interpretaçãoeaplicação
dasnormasquecompõemoordenamento jurídico. Asdeci-
sões do Poder Judiciário consistememnormas individuais
concretas, ou seja, válidas para as partes envolvidas em
determinadas demandas judiciais. Essas decisões, por sua
vez, serão tomadas a partir de técnicas de interpretação do
conteúdo,sentidoealcancedasleisquecompõemessenovo
sistema de direito. Necessariamente, a interpretação deve
efetuar uma concatenação lógica dessas normas.
Assim,asmudançasocorridasnasociedademodernaem
relaçãoàeradigitalderamorigemaumnovoramododireito
que pode ser denominado direito digital por abordar vários
aspectos que envolvem as relações decorrentes do uso e
acesso às novas tecnologias.
Essedireitodigitalécompostoporleis,atosadministrati-
vosedecisões judiciaisqueenvolvemas relações jácitadas,
ou seja, corresponde à áreadodireitoque estuda asnormas
jurídicas que envolvemosmeios digitais.
Épossíveldestacaralgumasnormasquefazempartedes-
se ramododireito: aquelas referentes à segurançade crian-
çasnainternet(proteçãocontrapedofilia,
ciberbullying
,entre
outros); a proteção demarcas emambientes eletrônicos; as
práticas legais do uso de tecnologia como a proteção contra
plágioeusurpaçãodeobrasalheias (pirataria), ouso indevi-
do e não autorizado de imagem, a invasão de privacidade e
intimidade,asofensasàhonra(calúnia,difamaçãoeinjúria);
aproteçãodedados sigilososdepessoas físicas e jurídicas e
de empresas e entidades da administração pública direta e
indiretaeque,recentemente,foiampliadacomatipificação
de crimes de informática aprovada pelo Senado Federal.
Ressalte-se que a aplicação dessas normas estende-se
a outros ramos do direito, como o direito processual. A
jurisprudência tem se firmado no sentido de aceitar, como
provas processuais, informações divulgadas através de
novas tecnologias.
Assim, e-mails são aceitos como provas em ações tra-
balhistas que incluem a comprovação de assédio moral e
sexual ou até mesmo vazamento de dados sigilosos para
concorrentesdoempregador. Umprocesso trabalhista, no