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Revista da ESPM – Março/Abril de 2002
AN – A seleção de 90, na Copa da
Itália, jogou muito mal o tempo todo.
É até um fenômeno curioso. Todo
mundo nos botecos, nas esquinas –
como diria o Nelson Rodrigues –,
está preocupado porque o Brasil não
tem uma seleção para jogar o mun-
dial daqui a um mês. Não é bem as-
sim. A seleção existe. Pode não ser
a seleção do Brasil, a seleção dos
brasileiros. Mas é a seleção do
Felipão e ela existe. É a seleção que
fez fiasco na Copa América; que fez
fiasco nas eliminatórias, em alguns
amistosos. Mas existe. Por conse-
guinte, não é verdade que não te-
nhamos uma seleção três meses
antes. Nós já a temos há um ano.
Ela não conquistou a nossa confian-
ça até agora e isso é bem diferente.
A base está na cabeça do Felipão e
ele não esconde de ninguém. O go-
leiro é o Marcos; o lateral direito é o
Cafu; o zagueiro central é o Lúcio; o
quarto zagueiro é o Roque Júnior; o
lateral esquerdo é o Roberto Carlos;
no meio campo, você tem o Emer-
son; tem o Rivaldo mais adiante e
tem o Edílson lá na frente revezan-
do talvez com o Luisão. Agora, se
em 11, você tem 8, três dúvidas não
descaracterizam um time. Se você
for à França, ela deve ter no mínimo
duas ou três dúvidas também. Apró-
pria Argentina deve ter uma ou duas
dúvidas. Mas a base existe. A dife-
rença é que os argentinos estão
muito felizes e confiantes com a se-
leção deles, os franceses felizes e
confiantes com a base deles. Os
portugueses, os espanhóis também.
Mas nós estamos profundamente
descontentes e desconfiados da nos-
sa. É uma situação curiosa. Eu até
propus, um dia desses, que se fizes-
se uma pesquisa nacional para sa-
ber se deve ou não deve levar o
Romário, para criar uma situação de
fato. Mas, o pensamento nacional
continua sendo o do treinador.
JR – Você trabalhou com o João
Saldanha?
AN – Em televisão.
JR – Não foi seu colega de trabalho
jornalístico?
AN – Não. Trabalhamos em televi-
são. Eu era diretor de esporte e ele
era um comentarista. Trabalhamos
numa mesa-redonda que fizemos no
Rio de Janeiro.
JR – Estou lembrando do
Saldanha porque, em 69, quando
ele foi técnico, teve uma atitude até
hoje lembrada por todos. Quando
lhe perguntaram qual era o time,
ele deu aquela famosa resposta:
“você não precisa me perguntar
qual é o time, porque o Brasil
inteiro sabe qual é. E recitou o time
com que, naquele momento, o
Brasil inteiro concordava. Por que
isso não acontece hoje? Por que
o time do Felipão não é o time dos
brasileiros?
AN – O time do Felipão, seguramen-
te, não é o time do brasileiro. Eu não
sei qual é o time dos brasileiros.
JR – Porque, hoje, isso não é
óbvio. Ninguém poderia dizer o
que disse o João Saldanha.
AN – A menos que o Saldanha da
seleção, nos anos 2000, tivesse pre-
parado uma base e essa base tives-
se correspondido. Porque, na verda-
de, o que o Felipão fez foi apenas
pegar a base que era do
Luxemburgo. E foi a base do
Luxemburgo? Qual era o óbvio dele?
Foi ir buscar os jogadores brasilei-
ros que jogam lá fora, que, suposta-
mente, fazem sucesso lá fora. Na
verdade, o nosso nível de exigência,
em matéria de jogador, é bem maior
que o do europeu. Então, quando o
Roque Júnior vai para o Milan ou
para o Inter, isso significa, para a
cabeça do brasileiro, que o Roque
Júnior é um excelente jogador.
Caso contrário, não iria. Nin-
guém faz uma reflexão óbvia:
por que ele foi? Porque exis-
te um mercado que
falsifica situações,
para empresári-
os e dirigentes
ganharem di-
nheiro. Disso,
você não te-
nha a menor
dúvida. Tanto,
que 30% a 40%
dos jogadores
que vão para lá,
voltam antes de se
firmar. E os que se
firmam, firmam-se no
futebol que não têm.
Na Itália, por
“Nós não nos
preparamos para
ter o futebol-
empresaqueos
temposmodernos
exigem.”
“Não tenho a
menor dúvida de
dizer que o futebol
hoje é uma
organização n
mafiosade
dimensão
internacional.”