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Revista da ESPM – Março/Abril de 2002
Botafogo, invadindo a Zona Sul. A
grande rivalidade clubística do Rio de
Janeiro sempre esteve nas origens
de Botafogo e Flamengo. Ninguém
ignora isso. Estou falando do tempo
da regata, quando o remo era o es-
porte da elite. Os remadores do
Botafogo davam uma surra nos re-
madores do Flamengo e depois iam
fazer “footing” na Praia do Flamengo
– mostrar seus músculos, seduzir as
mocinhas. Isso fez com que o
Flamengo reagisse, se transformas-
se num clube e acabasse sendo um
clube de futebol poderoso.
JR – Aliás, ainda se chama Clube
de Regatas do Flamengo.
AN – Como o Botafogo Futebol e
Regatas. Como o Clube de Regatas
Vasco da Gama. Era o esporte pre-
dominante no Rio de Janeiro. Eu não
tenho a menor dúvida de que a pai-
xão clubística – voltando à tese inicial
– é mais poderosa do que a paixão
pela seleção. Embora estejamos ven-
do alguns fenômenos assustadores
no plano da paixão clubística, que é
essa coisa dos torcedores se aliarem
a grupos políticos e começar a exer-
cer um papel político nos estádios, in-
vestindo contra as torcidas contrárias
e fazendo um trabalho de pressão so-
bre os jogadores. Recentemente, a
torcida invadiu a sede do Fluminense
para tomar satisfação. E os Gaviões
da Fiel já tinham feito isso no
Corinthians. Acredito que seja um fe-
nômeno novo. Foi o Bebeto de Freitas
que revelou: todos os clubes destinam
2 a 3 mil ingressos para as torcidas
organizadas que, por sua vez, reven-
dem, na porta dos estádios, os ingres-
sos para terceiros, fazendo o papel de
cambistas para ganhar dinheiro à cus-
ta do clube. Isso é uma deformação
brutal do que deve ser o futebol.
JR – Nós vamos realizar uma
mesa-redonda, na ESPM, para
discutir o negócio do esporte.
Uma coisa que sempre me
perturbou, como profissional de
marketing e amante do esporte:
por que nós, brasileiros, não
somos capazes de fazer desse
futebol maravilhoso, um grande
negócio? Se temos essa matéria-
prima e esse produto tão
fantástico, por que somos tão
incompetentes para fazer disso
um sucesso comercial?
AN – Vejo isso de uma maneira mui-
to clara. Nós não nos preparamos
para ter o futebol-empresa que os
tempos modernos exigem. Para uma
empresa dar certo, ela tem que ter
objetivos muito claros; tem que ter
planos de viabilização e projetos; e
tem que ter competência para
administrá-la. Eu nem estou muito
preocupado com as questões éticas.
Isso se tira de letra. O próprio mer-
cado vai tratando de depurar.
JR – O que você está chamando
de “questão ética” é a desones-
tidade na operação comercial?
AN – Desonestidade da cartolagem,
de como a coisa se deteriorou, do
ponto de vista moral, porque eles são
muito despreparados. De um modo
geral, eles são absolutamente
inescrupulosos. Isso, eu não tenho
a menor dúvida. Eles vivem monta-
dos em uma estrutura de poder
indestrutível, essa coisa de um
poder maior, sustentado
por capitanias here-
ditárias – que são
as federações –
“Fui um
privilegiado por
ter ficado à
sombradessa
geração
maravilhosa, que
meensinouas
liçõesbásicasde
jornal.”