Setembro_2006 - page 26

Publicidade e
pós-modernidade
Essa frase também traduz a nossa
forma de nos relacionarmos com a
autoridade, ao espírito cognitivo. Isto
é, ao Logos. Essa injunção bíblica
repousa sobre isso: não precisamos
de algo que suscite a essência, mas
somente desenvolver um processo
cognitivo, puramente racional. Santo
Agostinho justificará o monoteísmo
comum simples ditado: “a razãohu-
mananos conduzàunidade”.
E, não por acaso, é justamente o
monoteísmo, basede todaa tradição
judaico-cristã, que valoriza a razão
acima de todas as coisas. Já o carte-
sianismo fala da imaginação como
sendo a “louca da casa” – expressão
exata usada por Descartes – onde a
“casa” seriao cérebro, naturalmente,
ea “louca” seriaa imaginação.
Darei, como último exemplo, o pri-
meiro livro de Jean Paul Sartre (de
1936), que é sobre a imaginação.
Sartreretoma todaessa tradiçãocarte-
sianaquemarginaliza tudooque tem
aver coma imagem, a imaginaçãoe
o imaginário.Trata-seda“estigmatiza-
ção da imagem”, ou seja, a imagem
sobseusdiversosaspectosétotalmente
marginalizadaecolocadaemsegundo
planoem relaçãoà razão.
Paraaspessoasdaminhageraçãonão
se falava, por exemplo, de publici-
dade.Mas falava-se de reclame, que
por suavez tinhaum ladopejorativo.
Empiricamente traduzia esse amplo
processo do iconoclasmo: nós que-
bramos o ícone, o ídolo. Resumindo
a introdução, sem pensar emDeus
ouna realidade, temosaí essegrande
filão–oda tradiçãoocidentalqueche-
gará àmodernidade ou aos “tempos
modernos”. Nesse momento nasce
a performatividade, que deixou de
SantoAgostinho
justificará omono-
teísmo com um sim-
ples ditado: “a razão
humana nos conduz à
unidade”.
F
ladooqueeradaordemdo sensível e
sebaseia sobreumaconcepçãoacép-
tica do mundo. Sobre um conceito
que é esquizofrênico. Gilbert Durand
– grande antropólogo do imaginário
– propôs esta idéia, mostrando como
naesquizofrenia iremos cortar, dividir,
separar ou eliminar alguma coisaque
nãomerecesermantida.Esseéogrande
conceitoesquizofrênicoeascético.
Outro autor chamadoThomas Kuhn
– talvezvocêsoconheçam– falarádas
revoluções científicas e mostra que
aquilo que foi a performatividade da
tradição ocidental baseava-se numa
retidão da razão. Sob esse aspecto a
tradiçãoocidental deixoupelocami-
nhoasbagagens inúteis, quenocaso
é a imaginação. O problema é que
agora há um retorno daquilo que
deixamospelocaminho.
Tentareidaralgunselementos teóricos
através de imagens que, afinal de
contas, constituem também o nosso
cérebro reptiliano. O que nós inte-
gramoscom issoé fundamentalmente
a estigmatização. O exemplarismo
de São Boaventura (século XIII) é
uma exceção. Ele, filósofo, teólogo
e franciscano, opõe-se a SãoThomas
de Aquino, um dominicano. São
Boaventuravai desenvolvero“exem-
plarismo”,queno fundoéumacópia
do exemplo primordial, que éDeus.
Atravésde imagemexisteumprocesso
analógico – segundo a expressão de
SãoBoaventura, umprocessodepar-
ticipaçãoontológica.
Quero dizer com isso que: “eu par-
ticipo ontologicamente a Deus” em
comunhão com as diversas imagens
dos santos que também o represen-
tam. O exemplarismo é a teologia
da imagem, quepor suavezéaquilo
que permaneceudopaganismo e no
próprio catolicismo. Que, na minha
opinião,permanecepoliteístaepagão.
Ocultoaos santos eàVirgem remete
a um antigo substrato que é verda-
deiramente pagão. O exemplarismo
iráexpressar-sede forma simples.Os
presépios da Itália, por exemplo, não
visamdesenvolver nenhuma teologia
racional, mas apenas exemplificar
aquiloqueseriaonascimentodeCris-
to. O exemplarismo em Portugal ou
mesmo no Brasil pode ser detectado
nos “Caminhos de fé”deCongonhas
do Campo, emMinas Gerais, por
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