entrevista | fabio luchetti
Revista da ESPM
| setembro/outubrode 2013
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Alexandre
— Vivemos um paradoxo
nesta era dos serviços. Embora o foco
esteja mudando dos produtos para os
serviços, nunca se reclamou tanto, pelo
menos no Brasil, dos serviços prestados.
Onde está o problema: na qualidade do
que se oferece ou no marketing usado
para promover e vender esses serviços?
Fabio
— O problema está na filosofia
dessas organizações. Há, natural-
mente, problemas de mão de obra
hoje no Brasil. Se quiser fazer um
negócio benfeito, você terá de gastar.
Investir mais em treinamento para
tentar cobrir esses
gaps
. Mas esse é
um problema de convicção mesmo. O
erro está emusar a comunicação para
vender um conceito de benefício ao
cliente, quando, no fundo, na raiz da
gestão da empresa, provavelmente
o foco continua sendo o resultado. O
Brasil está sofrendo porque muitas
das empresas também estão sendo
reformuladas. Estamos vivendo a era
dos capitais abertos, que tendem a
privilegiar os resultados de curto pra-
zo. Aí, muitas vezes, as organizações
ficam ambíguas. Quando se aventura
a entrar numa indústria de serviços,
muitas vezes você colherá os frutos
no longo prazo. Então, todo o sistema
— sua máquina, sua cultura, seu mo-
delo de gestão — precisa estar voltado
para isso. Todos têm de acreditar que
serviço é importante.
Alexandre
— As grandes empresas
de serviços encabeçam os principais
rankings de reclamação do consumi-
dor. Há uma percepção generalizada
de que os prestadores de serviços não
colocam o consumidor no centro de
suas atenções. Por que não consegui-
mos superar esse estágio de desenvol-
vimento dos negócios?
Fabio
— Parte do problema aparece
quando eu, como executivo, quero
administrar meu produto, minha
comunicação, minha relação com o
cliente, mas todo o meu
back office
,
tudo aquilo que cria uma experiên-
cia para o cliente, está terceirizado,
longe de mim. Minha relação com
o cliente é pela fatura que ele paga
todo mês. Querer trabalhar com ser-
viços implica em querer arregaçar
as mangas e enfrentar os proble-
mas. Ter os problemas próximos de
você. Eles têm de estar no teu colo,
todo o santo dia. Você tem de come-
çar o dia sabendo tudo o que fez de
errado com os seus clientes ontem.
O serviço é diferente de um produto.
A experiência de um serviço passa
por pessoas, e a taxa de erros de um
ser humano não é pequena. É dife-
rente de uma linha de produção, que
você acerta e vai embora. Serviço
não tem jeito. É gente com gente. Os
executivos têm de repensar a ma-
neira como lidam com esse assunto.
Alexandre
— Por melhor que seja
desenhada uma apólice de seguro, se
eu, como cliente, não me sentir bem
tratado e seguro na relação com a
companhia, vou acabar insatisfeito.
Aí entra o componente “gente que
atende gente”. O que vocês fazem de
especial no treinamento das equipes
que lidam com o público?
Fabio
— Não posso entrar no detalhe.
É omesmo que pedir a fórmula da Co-
ca-Cola. Posso até te dizer uma lista
de coisas que a gente faz, mas ela não
vai, necessariamente, adiantar para
outras companhias. Qual é a cultura
da sua empresa? No processo de re-
crutamento e seleção, o que você fala
para cada funcionário que vai atender
a um cliente? Qual é o seu negócio?
Aqui na Porto Seguro a gente fala que
o nosso negócio não é seguro, não é
cartão de crédito nemconsórcio. Nos-
so negócio é atendimento.
Alexandre
— Elabore, por favor, essa
ideia.
Fabio
— Qual é o nosso maior patri-
mônio? São as relações. O que é o
seguro? Uma apólice. O que é uma
apólice? Um contrato. Você tem re-
ceio de que aconteça alguma coisa e
paga para proteger seu patrimônio.
Eu estimo pelas minhas estatísticas
a probabilidade de esse sinistro acon-
tecer e te cobro umvalor por isso. Ago-
ra, se o teu carro não for roubado, se a
tua casa não tiver problemas, a nossa
relação termina aí. No fundo, é por
isso que começamos a criar, há duas
décadas, o conceito de inserir servi-
ços para agregar valor nessa relação.
Alexandre
— No caso da venda de
seguros, boa parte das relações com o
consumidor se dá por meio de um inter-
mediário, um corretor. Deve ser duro o
desafio de padronizar o atendimento.
Aqui na Porto Seguro, a gente fala
que o nosso negócio não é seguro, não
é cartão de crédito nem consórcio.
Nosso negócio é atendimento