Maio_2003 - page 85

Revista daESPM –Maio/Junho de 2003
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Entrevista com JoséMurilo de Carvalho
que sobre os civis já existe pesquisa
mostrando,curiosamente,quemuitas
causasquevãoparao juizadoespecial
civil se referema consumo–direitos
violados no processo de consumo.
Resumindo, diria que o bom cidadão
tende a ser um bom consumidor, no
sentidodereclamar,deterconsciência
deseusdireitos.Noentanto,comono
nossocaso–emquedireitosocialveio
em primeiro lugar – a pergunta que
vocêfaz,sobreconsciênciadedireitos,
os que respondem alguma coisa,
respondemmajoritariamentedireitos
sociais,enãopolíticosecivis.Significa
que a própria idéia de direito está
entrandonacabeçademuitaspessoas
via direito social, que é um direito
passivo. Eunãomesurpreenderiase,
no caso do direito do consumidor,
mesmo que a falta de concepção de
direito civil o afete – como é coisa
muito presente no cotidiano das
pessoas–quesecomeceaíaverificar
umefeito inverso...
JR – Isso é interessante: a
consciênciadedireitodeconsu-
midor gerando consciência da
cidadania.
JM – Acredito na hipótese, porque
aconteceunocasodosdireitossociais.
Quando as pessoas dizem: “Quero
meus direitos” – expressão popular,
são direitos trabalhistas e sociais.
Creioquepoderáhaveresseefeitono
que se refere ao consumidor porque
eleéocotidiano. Vocêvai auma loja
eé fraudadonumavenda. Issoéalgo
essencial para a vida cotidiana. Na
medidaemqueaspessoascomeçam
a se informar, elas vão recorrer, vão
ao Procon. Talvez haja estatísticas
sobre isso. Volta e meia, aparecem,
nos jornais, reclamações contra
determinada empresa, serviços
públicos etc. Seria interessante ver o
crescimentodisso.Eaminhahipótese
passariaaser:oconsumidorforma
ocidadão.
JR – Quando disse ao nosso
presidente, FranciscoGracio-
so, que iria entrevistá-lo, ele
disse:“Pergunteaeleporque
obrasileiroémaiscríticoem
relaçãoàsempresaseempre-
sáriosdoqueaogoverno”.Por
que,quandoocidadão,emSão
Paulo, trafega numa estrada
mantidapelaempresaprivada,
paga pedágio, está mais
dispostoa reclamardealgum
problema do que na estrada
mantidapelogoverno federal,
todaesburacada–eeleaceita
aquilocomoum fatodavida.
JM – Eu não sei se ele reclama
menos do governo. A nossa
relaçãocomogoverno tradicional
émeioesquizofrênica. Quer dizer,
de um lado, há a idéia de que o
governoé responsável por tudoe,
portanto, tudo que sai errado é
culpa dele. É uma coisa antiqüís-
simadanossa cultura. Tema ver
comumestadismomuitoforteque
possuiseuladonegativodereforço
do poder e do controle, mas que
possuitambémumladopositivoda
inclusãosocial,queéapontadopor
autores Richard Morse que o
chama de “iberismo”. Segundo
ele,avisão ibéricadapolíticaseria
distinta no sentido de salientar o
Estado como um instrumento de
inclusão,deproteçãosocial,contra
a ênfase na liberdade e na
iniciativa individual, no conflito
típicodavisãoanglo-saxônica.As
pessoas sempre hesitam entre
essas duas coisas. Reclama se o
estado é responsável por tudo,
mas, do outro lado, querem o
estadomaisprotetor,paternalista.
É uma coisa ambígua. Talvez o
pontodadiferençasejaesse:você
falamaldogoverno,masnãosabe
muitobemoque fazerapropósito
disso.Como recorrer?Atémesmo
eleição. Agora, com o processo
democráticoseaperfeiçoando, as
pessoas vãoaprendendoausar a
eleição como um instrumento de
críticaemudançapolítica. Talvez,
no caso de empresa, seja mais
simplessaberoque fazer–oalvo
é mais fácil. Vou lá e reclamo e
essa reclamação, realmente, tem
maisefeitodoqueseeu forauma
repartiçãopública.Talvezsejamais
“N
a
República
Velha
,houve
eleições
presidenciais
em
que
3%
votavam
.”
“A
s identidades
nacionais
fortesse
consolidaram
em
momentos
de
guerra
.”
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