Maio_2003 - page 90

Revista daESPM –Maio/Junho de 2003
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entrevista
“O
primeiro
argumentoéa
natureza
,
quenão
tem
avercoma
história
dopaís,
comoqueas
pessoas
realizaram.
JR–Vocênãovêumperigode
issotudosersubstituídopelas
relações de consumo? Quer
dizer, estamos falando desse
sentidodeparticipaçãocomo
um ingrediente importanteda
cidadania. E aí temos uma
sociedadeglobalquechegae
tem uma tremenda força
iconográfica, que tem a ver
comobjetos, consumo.
JM – Eu havia apontado um
possível efeito positivo da briga
pelo direito de consumidor sobre
a cidadania. E você está levan-
tandoumpontodistinto: oefeito
daglobalizaçãosobreacidadania.
JR – Quando a gente fala do
futebol, do carnaval, estamos
falando,naverdade,departici-
pação na política. Mas a
relação de consumo também
não é política e ela também
leva a uma participação
social.
JM – Sim, mas no caso do
consumo,vocêtemummecanismo
de consciência e afirmação de
direitos, que não é o caso do
futebol,docarnaval.Aquestãodo
consumo tem uma interface com
acidadaniaviaconhecimento, via
exigênciadedireitosqueoesporte
não tem. E, aí, a interfaceémuito
maisnítida.Oquediziaéquesea
ênfase no mercado é parte da
globalização, elaémuitomais do
isso. Ela tem efeitos sobre a
questão da cidadania que
ultrapassam o problema do
mercado e da hegemonia do
consumo.Não creioqueoEstado
nacional vá desaparecer rápido,
mas, obviamente, entrou-se num
processo de que essa tecnologia
histórica–quecomeçounoséculo
XVIII – está, dois séculos depois,
entrandoemprofundoprocessode
transformação. A capacidadedos
Estados nacionais dedecidir está
sendo constantemente constran-
gida.EoexemplodaEuropaémais
nítido,porqueosEstadosnacionais
estão provavelmente desapare-
cendo. Então, haverá um Estado
commuitas nações e, aí, talvez,
aumentandoograude identidade
culturaldessasnações.Umexem-
plo extraordinário é a Holanda. É
umpaíspequeno,masdivididoem
sete regiõesculturais, emqueem
alguns lugares, grupos musicais
estão revivendo dialetos antigos.
Então, seria a volta para dentro,
masparaaspectosculturais.Quer
dizer, reafirmar uma identidade
coletivaviaculturaenãopolítica.
JR– Issoéaantítesedaquela
idéia de guerra. É um reforço
deidentidadenacionalvoltada
paradentroequeocorrenuma
comunidade onde não está
havendoumestímuloexterno.
JM – A guerra foi um elemento
fundamentalparacriar identidadesem
Estados nacionais. Aqui, é o fim do
Estadonacional. Éodeslocamentoda
nação e do estado que era o normal
antesdaformaçãodoEstadonacional.
Quer dizer, antes do século XVII, não
haviaumacoincidênciaentreEstadoe
nação. Havia, em geral, Estados
multinacionais, os impérios, e certas
nações tinhammais de um Estado. E
isso ainda existe na Bélgica, Canadá,
Espanha. Por muitos anos, a União
Soviética.AChina talvezsejaoúltimo
exemplo de império multinacional e
podeexplodircomoexplodiuo império
soviético. A colagem dessas duas
coisas durou dois séculos e, agora,
está-sedescolando.
JR–Nãoécuriosoquevocêtenha
ummundo que passa pelo que
todos chamam de globalização e
– de repente – percebe esse
fortalecimento da diversidade?
Nãosãocoisasopostas?
JM – Não. Porque – junto com essa
globalização–veioomulticulturalismo,
queéummundoglobalizadopolíticae
economicamente e, agora, cultural-
mente. É uma espécie de compen-
sação. Por isso que se dá a perda de
identidadeviapolítica.Oexemplomais
claroéodaEuropa,emqueopoderde
um presidente, ou de um primeiro
ministro, está sendo absolutamente
reduzido.Bruxelas játemoparlamento
europeu e, claramente, os Estados
nacionais estão-sedesagregando. No
entanto, há entidades nacionais
“O
Brasil
se
sente
cidadão
em
doismomentosde
festa
:no
Carnaval
e
quandoaSeleção
está
emcampoe
jogabem
.”
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